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4 de agosto 2022

"Militares atendem interesses privados e eleitorais de Bolsonaro", diz especialista sobre ferramenta de espionagem

Para a advogada Flávia Lefèvre, há uma “violação de transparência, publicidade e moralidade” na compra pelo Comando de Defesa Cibernética do Exército de uma ferramenta que permite a extração de informações de telefones celulares e registros que são armazenados nas redes sociais. Integrante da Coalizão Direitos na Rede – entidade que reúne mais de 50 organizações em defesa dos direitos digitais, como a proteção dos dados de pessoas e a privacidade na internet –, a especialista alerta que a aquisição expõe que os militares “vêm atendendo de forma direta os interesses privados e eleitorais do presidente da República”, Jair Bolsonaro (PL), com objetivo de “causar um tumulto com relação ao processo eleitoral que está em vias de acontecer”, adverte. A análise foi feita em entrevista ao jornalista Rafael Garcia, na edição desta quinta-feira (4) do Jornal Brasil Atual. E leva em conta reportagem publicada ontem pelo jornal Folha de S.Paulo, que mostra a contratação, com dispensa de licitação, de um sistema de espionagem pelo Exército, assinado no final do ano passado. A ferramenta, no entanto, é normalmente utilizada pelas polícias Civil e Federal, assim como o Instituto Nacional de Criminalística e o Ministério Público como forma de acessar dados, inclusive bloqueados, de aparelhos apreendidos a partir de decisões de busca emitidas pela Justiça. 
Compra viola garantiasO contrato foi feito entre a empresa TechBiz Forense Digital e o Comando de Defesa Cibernética do Exército que tem à frente o general Heber Garcia Portella, indicado para fazer parte da Comissão de Transparência das Eleições (CTE) montada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O mesmo general que vem dando vazão ao discurso golpista de Bolsonaro, que vem tentando descredibilizar o sistema eleitoral brasileiro com ataques já sucessivamente desmentidos.De acordo com Flávia Lefèvre, há “diversos problemas” nessa compra. A começar pelo fato de que não existe uma explicação razoável e transparente para essa contratação, conforme observa. A reportagem da Folha tentou contato desde o dia 25 de maio com o Exército, mas não foi respondida em nenhuma das investidas. A falta de explicações remete a um cenário grave, para a especialista, indicado pelo próprio presidente da República em reunião ministerial, em abril de 2020. No encontro, que ficou mais conhecido pela intenção do governo em “passar a boiada”, “aproveitando” que o foco estava na pandemia de covid-19, Bolsonaro também manifestou seu desejo de ter um órgão investigativo. 
Apoio na leiCom a compra da ferramenta de espionagem, Flávia vê “um caráter pessoal no trato das questões de investigação, relacionadas ao Exército, ao poder Executivo Federal. E isso também é uma violação, porque a motivação e finalidade têm que estar vinculadas ao interesse público, e não a interesses partidários e eleitorais privados”, contesta. “E temos um cenário que a gente sabe, também noticiado em 2020, de que esse governo tem a intenção clara de investigar pessoas de forma arbitrária e ilegal, como foi o caso daquela lista de jornalistas e influenciadores em que se classificava as pessoas como ‘detratores’, ‘apoiadoras’ ou ‘neutras’”, relembra. O Exército lista ao menos 41 funções para o equipamento, conforme descreveu também a RBA. Entre elas, a de recuperar imagens e localizações apagadas e capturar dados de sistemas de nuvem dos aparelhos e de registros em redes sociais como Twitter, Facebook e Instagram. Os documentos da contratação não especificam, no entanto, quais celulares passariam a ser acessados, nem qual é o embasamento jurídico para esse tipo de acesso a dados privados da população. A especialista destaca que a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), que entrou em vigor em 2020, reforça que os poderes públicos também estão sujeitos à vigência dessa lei. Além disso, qualquer investigação deve ter o devido processo instaurado para ser realizada, conforme acrescenta Flávia Levèfre. 

Fonte: Rede Brasil Atual / Imagem: Marcelo Camargo - Agência Brasil