Climate Change Summit debate transição energética: "O lixo de hoje é a matéria-prima do amanhã"
Realizado um ano após a enchente histórica que atingiu o Rio Grande do Sul, o Climate Change Summit encerrou sua primeira edição neste sábado (3), em Porto Alegre. Organizado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o evento reuniu especialistas nacionais e internacionais para debater estratégias de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. A última palestra tratou dos desafios enfrentados para uma transição energética justa.Ao longo de dois dias, o Salão de Atos da UFRGS recebeu reuniu líderes governamentais, empresariais e comunitários, além de especialistas e autoridades internacionais, com ênfase nos representantes do Sul Global. Com nove palestras principais e nove painéis temáticos, o evento teve o seu encerramento com o debate sobre a atual situação da transição energética no Brasil e no mundo, considerando os aspectos econômicos, sociais e ambientais que envolvem o tema.Coordenada pelo professor da UFRGS Jairton Dupont, a apresentação contou com as palestrantes Elisangela Almeida, bióloga e Superintendente de Meio Ambiente na Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Caarem Studzinski, especialista em riscos climáticos e planejamento de resiliência para o setor energético, e Karin Correa, engenheira agrônoma.Na abertura da palestra, o professor Jairton Dupont apresentou dados sobre a crise climática e sua relação com o sistema econômico global. Destacou como principais fatores o uso intensivo do solo, que o torna oxidativo, a dependência de combustíveis fósseis e o consumo desenfreado. Para ele, todos esses elementos podem ser resumidos em uma única frase: “o modelo econômico que nós temos”.Em sua fala, Dupont também questionou a estrutura econômica baseada no crescimento ilimitado em um planeta com recursos finitos. Ele destaca que 98% da biodiversidade do planeta já foi destruída pelos humanos, restando apenas 2%. Assim, aponta a necessidade da execução de uma economia circular.“O lixo de hoje é a matéria-prima do amanhã. Hoje, o que nós retiramos da natureza já é superior ao que ela pode nos oferecer de volta, nós já ultrapassamos esse limite”, pontuou.Em seguida, a bióloga Elisangela Almeida debateu o cenário brasileiro frente ao tema, destacando que o País possui uma matriz energética majoritariamente renovável, em posição mais avançada em relação a outras nações. Ao focar na matriz elétrica, enfatizou que o panorama é ainda mais renovável, com as fontes hidrelétrica, solar e eólica.“A gente tem muitas fontes renováveis e a gente investe na utilização delas. E a gente investe também em inovação, em tecnologia. Então isso faz com que a gente descarbonize a nossa matriz energética”, explicou.Elisangela pontua que a transição energética envolve, principalmente, a substituição de fontes fósseis por alternativas renováveis. No entanto, reforçou que essa mudança precisa vir acompanhada de soluções ambientais e socioeconômicas, especialmente diante das profundas desigualdades existentes no Brasil.As especialistas Caarem Studzinski e Karin Correa trouxeram a perspectiva regional para o debate, com foco no contexto do Rio Grande do Sul. Conforme apresentado, o território gaúcho apresenta um alto potencial para a geração de energias renováveis, mas demanda um planejamento sustentável que considere os efeitos das mudanças climáticas.A engenheira agrônoma Karin chama atenção para a necessidade de uma gestão hídrica mais ampla no Rio Grande do Sul. Segundo ela, os planos de bacia hidrográfica foram elaborados com foco na escassez de água, mas não contemplam cenários de excesso, apesar da crescente ocorrência de eventos extremos, como os registrados em maio de 2024.“O nosso planejamento não prevê os excessos. E aí a gente vai deixar essa água potável ir embora por falta de planejamento. Por falta de entendimento de que a gente pode, sim, usar o nosso potencial para ter reservação. Só que essa reservação precisa ser paga por alguém, para que a gestão das águas possa acontecer, e isso faz parte da transição elétrica”, explica.Karin argumenta que estado tem potencial para se tornar um celeiro de água, mas que, ao invés de aproveitar esse recurso, o estado o desperdiça. Para ela, é preciso enxergar essa realidade não como um problema, mas como uma oportunidade de agir para evitar novas tragédias. “Se a gente não fizer gestão de recursos hídricos e não aproveitar todas as energias que a gente tem, para promover o desenvolvimento sustentável, a gente não avança” disse.No encerramento do evento, a reitora da UFRGS, Márcia Barbosa, fez a leitura da Carta de Porto Alegre, documento elaborado ao longo dos dias de atividades. A carta reúne recomendações de ações voltadas à mitigação e adaptação às mudanças climáticas, com atenção especial ao contexto dos eventos extremos vivenciados recentemente no Rio Grande do Sul.Uma das ações propostas, e que, segundo a reitora Márcia Barbosa, será uma das primeiras a ser implementada, é o encaminhamento ao Conselho Universitário da proposta de criação da Secretaria Especial de Emergência Climática Ambiental.“Eu sinto falta disso nos governos, de ter um setor que seja escutado e que tenha este papel de escutar. Eu não vejo isso acontecendo hoje com o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. Infelizmente, o resto dos governos, mesmo que seja a Secretaria do Meio Ambiente, não há escuta. E aqui na UFRGS, com a criação da Secretaria, vai ter escuta”, pontua Márcia. Fonte: Rede Brasil Atual / Imagem: Sul 21