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11 de julho 2019

Prefeitura retira moradores que voltaram à ocupação Baronesa. “Voltamos pra cá por causa do frio”

Integrantes da Ronda Ostensiva Municipal de Porto Alegre (Romu), com apoio de um destacamento do pelotão de choque da Brigada Militar, retiraram, na tarde desta quarta-feira (10), um grupo de 14 pessoas que estava abrigado em um antigo casarão localizado na esquina das ruas Baronesa do Gravataí e 17 de junho. O casarão, que estava abandonado, foi ocupado no dia 28 de março por um grupo de dez famílias, e foi alvo de uma reintegração de posse no início de julho. Os moradores disseram que voltaram ao prédio por causa do frio que se abateu sobre Porto Alegre na última semana. Participavam do grupo as famílias que foram despejadas do abrigo municipal da prefeitura por falta de pagamento. Na ação da Prefeitura, Fábio Policarpo, pai de cinco filhos foi preso por “tentativa de resistência”. Em nota, a Prefeitura disse que “agentes atuaram de forma a garantir a integridade física e a manutenção da segurança dos envolvidos”.Segundo Glauber Zilio, comandante da Ronda Ostensiva Municipal, o setor de inteligência da Romu informou que um grupo de pessoas começou, na manhã desta quarta-feira, a ingressar no local que já havia sido reintegrado pela Prefeitura. “Diante disso, conforme a legislação prevê, viemos aqui para retomar o local. As famílias tinham sido retiradas daqui no início do mês e estávamos monitorando o local para evitar que eles reocupassem a área. Conseguimos negociar com todos os invasores e a maior parte saiu. Só um cidadão não aceitou a ordem de retirada e acabou sendo conduzido à delegacia para registro. Ao todo, foram 14 pessoas retiradas, todas identificadas. A Fasc está retornando aqui para o local para buscar os seus pertences e oferecer abrigagem para que não permaneçam na rua”, afirmou Zilio.
“As pessoas estão morrendo de frio”Os moradores protestaram contra a ação dos agentes da Prefeitura. “É por demais a violência e o abuso de poder com que esse governo trata a vida das pessoas. A gente queria abrir uma negociação com eles, mas a guarda municipal não quis saber. Nos deram cinco minutos pra sair, nós lá dentro com gestantes, crianças e um senhor idoso”, protestou Alice de Oliveira Martins, que milita na luta por moradia há mais de dez anos. “As pessoas voltaram pra cá por causa do frio. As pessoas estão morrendo de frio”, acrescentou. “Elas foram jogadas no meio da rua, assim como nós fomos jogados no meio da rua por uma reintegração de posse neste mesmo espaço. As políticas públicas não são cumpridas, mas a violência é sempre executada, sem pensar contra quem, mesmo que sejam crianças pequenas e mulheres grávidas”.Na ação da Guarda Municipal, Fabio Policarpo foi preso, acusado de desacato à autoridade. “Ele disse que sabia os direitos dele e os nossos direitos, questionou a ação e tentou abrir uma negociação. Disseram que ele estava sendo preso porque tinha desacatado a autoridade, sendo que não foi nada disso que aconteceu. Eu e a companheira dele estávamos juntos. Ele foi preso somente por uma demonstração de poder que eles têm e gostam de executar. Enquanto isso, a Brigada Militar também estava lá na esquina esperando para agir”, relatou Alice. Ela destacou que já existe uma cooperativa, um projeto para construir um centro cultural na área e os moradores vêm tentando negociar com a Prefeitura. “Estamos em uma negociação, mas a gente sabe que o município está só nos enrolando. Estamos fazendo o que a gente prometeu, mas o município só sabe agir com violência”, assinalou.Após serem retiradas da área, as famílias ficaram em uma calçada lateral ao prédio aguardando para pegar seus pertences. Funcionárias da Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc) estiveram no local e ouviram das famílias que elas não aceitam serem divididas, com os pais indo para um lugar e as mães e filhos para outro. Até o final da tarde desta quarta, a Fasc não havia se manifestado oficialmente sobre a ação.
“Direito de existência”“O que estamos vivendo em Porto Alegre não é mais só um problema de moradia, mas sim de violação do direito de existência dessas pessoas”, disse Ezequiel Morais, do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM). Ele observou que, na última semana, já ocorreram duas mortes associadas ao frio em Porto Alegre por falta de política pública de assistência social. “O governo municipal repete um discurso de que tem as soluções, mas, quando vamos ver na prática, essas soluções são todas falhas. Elas não se completam. Ao invés de trabalhar uma política para agregar as famílias e fazer a redução de danos, faz o contrário, dividindo as famílias. Na política de abrigo que a prefeitura disse que tinha, o companheiro fica no albergue, que funciona da manhã até às cinco da tarde, e sua companheira com o filho vão para outro albergue. Isso não tem lógica”, disse Ezequiel.Além das demandas provocadas pelo déficit habitacional na cidade, destacou ainda o integrante do MNLM, é cada vez mais urgente a necessidade de resgatar essas famílias. “Porto Alegre passa por um momento extremamente violento e quando as pessoas tentam procurar um lugar para conseguir tocar a vida, o município vira as costas. Quando faz alguma ação, ela é midiática, para dizer que é bonzinho e que todos poderão dormir com a consciência tranquila por uma noite”, criticou. Segundo Ezequiel, nos últimos dez anos, o Movimento Nacional de Luta por Moradia vem tentando trabalhar uma política que permita que as pessoas voltem para o centro da cidade e possam viver onde existe estrutura e serviços. “O maior número de vagas em escolas está no centro, mas, cada vez mais, as pessoas estão sendo jogadas para a periferia. Já que gostam muito de falar na Europa podiam seguir o exemplo dos países europeus que têm políticas para potencializar as regiões centrais”.

A posição da PrefeituraSegundo a Prefeitura de Porto Alegre, a Fasc está fazendo o “encaminhamento das famílias e de seus pertences”, enquanto a Guarda Municipal “permanece no local garantindo a segurança”. A nota publicada no site da Prefeitura afirma:“O Município demonstrou que não há condições de permanência das famílias no local. A própria decisão judicial foi fundamentada no risco que as pessoas corriam habitando o imóvel. Na ocasião, técnicos da Fasc fizeram a retaguarda das dez famílias, que receberam oferta de auxílio moradia antes da reintegração de posse. Três famílias já estão usando o benefício em moradia alugada. Para quatro delas, a Fundação está aguardando a indicação dos endereços dos imóveis para aluguel, que deve ser entregue por parte dos usuários, para que seja feito o pagamento. As outras três famílias não solicitaram o auxílio”.
Fonte: Sul 21

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